quinta-feira, 21 de abril de 2011

A Melhor Arte Marcial

Todo praticante de alguma alguma arte marcial, esporte de contato (como o Boxe) ou atividades que misturam aspectos culturais com luta (como a Capoeira), adere à prática dessa atividade por algum motivo. Isso é ponto pacífico e até mesmo redundante, pois ninguém realizaria uma atividade da qual não tivesse o mínimo de simpatia ou acreditasse na sua eficácia, seja ela qual for.
Via de regra, as artes marciais ou esportes que se destacam em competições, tendem a ser considerados pelos seus respectivos praticantes como superiores aos demais, pois a final de contas eles vencem competições e assim demonstram sua eficácia frente a todas as outras artes.
Devo discordar dessa lógica que se estabelece. Em primeiro lugar, pensemos o seguinte conceito: as artes marciais (aqui englobarei esportes de contato e adjacentes) que conhecemos nos dias de hoje, só continuam existindo porque existem praticantes abnegados que a praticam (desculpem a redundância), correto?
Como poderia existir uma arte sem praticantes? Impossível.
Em segundo lugar, se as artes marciais que são praticadas hoje em dia não fossem eficientes no que se propõe, elas ainda existiriam? Qual foi a fonte de suas técnicas se não a pesquisa e o teste de sua eficiência em campos de combate (durante guerras), duelos de vida ou morte ou até mesmo esportivos?
É fato que todas as artes marciais sérias que conhecemos nos dias atuais foram exaustivamente testadas, adaptadas, readaptadas e pensadas por grandes mestres e seus seguidores, evoluindo e se adequando a realidades regionais e culturais de cada período histórico.
Cada prática possui uma função e uma lógica própria (caso contrário, só existiria uma única prática), sendo assim, existem aspectos diferenciados que cada uma dá mais ênfase nos seus treinos.
Como dizer qual delas é melhor?
Não existe a melhor arte, ou como muitos dizem: a melhor arte é aquela em que cada pessoa se sente bem durante a sua prática.
Mas muitas vezes a lógica equivocada persiste: o lutador X pratica a arte Y e venceu o campeonato Z, logo a arte que ele pratica é a melhor (com o MMA isso ficou um pouco disforme, pois existem atletas que se especializam em um tipo de torneio).
Raciocínio lógico básico: se a arte fosse realmente definidora de quem é o melhor competidor, não poderia existir um campeão na disputa entre artes semelhantes. Correto?
Se essa lógica prevalecer, significa que se determinada prática marcial for tão suprema a ponto de ser invencível, qualquer lutador que disputar com outro que possui o mesmo treinamento, jamais conseguirá vencer e as lutas sempre acabarão em empate.
Existe um fator humano essencial e que muitos negligenciam...
Claro que os exemplos citados se referem àquelas artes de competição e que foram pensadas com esse objetivo. 
Mas a competição esportiva sob o manto de regras bem definidas pode ser considerado o único parâmetro de eficácia de técnicas? Acredito que não.
Existem aspectos muito mais sutis que não são contemplados pela competição esportiva. 
Vamos sair do campo do tatame e das regras e nos coloquemos num conflito urbano em que seja necessário enfrentar uma situação de risco em um ambiente desconhecido e com um número de atacantes desconhecidos: adiantaria por exemplo utilizar técnicas de sutemi waza (sacrifício, muito utilizada no Judo e aprofundada no Jiu-Jitsu Brasileiro)? Com certeza, não. Numa competição funcionam? Com certeza, sim.
Mas detalhe: nessas competições são proibidas mordidas, torção de pequenas articulações, dedo no olho, ataque aos órgãos genitais, cotoveladas na nuca ou outros golpes letais.
Podemos pensar em outras situações como um lutador de Muay Thai utilizando suas técnicas para desarmar alguém. As técnicas que são treinadas diariamente para competição funcionariam? Acredito que não. Mas em um ringue? Com certeza.
Poderíamos estender esse rol exemplificativo a todas as artes, inclusive ao Aikido, para exemplificar que cada arte é suficientemente completa e eficaz dentro de si mesma, dependendo muito do seu praticante para a sua eficácia.
Mas e se pensarmos nos aspectos filosóficos, emocionais, educacionais de cada arte? Afinal de contas, qual é o objetivo das práticas?
Séculos atrás, as batalhas se davam de forma campal através de espadas, lanças, escudos e as leis e regras de convivência eram muito mais amplas, não existiam órgãos judiciais bem estabelecidos e a justiça do olho-por-olho, dente-por-dente eram a regra geral. Fazia todo o sentido o treinamento de técnicas de combate para salvar sua própria vida e eliminar os perigos representados pelos outros inimigos. 
Após a Segunda Guerra Mundial, o mundo passou por diversas mudanças. As armas de destruição em massa demonstraram que não fazia mais sentido o combate homem-a-homem. A violência que muitos povos viveram trouxera reflexões sobre o papel do novo ser humano que deveria nascer após esse grave conflito.
Nesse contexto surgiram o Aikido, o Judo, Karate e todas as outras artes marciais praticadas atualmente. 
Evoluíram das técnicas de combate letais e se transformaram em meios de aperfeiçoamento humano, porém, ainda mantendo aspectos de auto-defesa essenciais.
Algumas artes deram ênfase à competição como forma de aprimoramento, outros pensaram essas técnicas como forma de organizar torneios com fins eminentemente econômicos e outras deram ênfase às práticas de aperfeiçoamento humano e manutenção da hierarquia, etiqueta e saúde.
Qual delas é a melhor?
Todas e nenhuma, depende de qual o objetivo do praticante.
Dessa maneira, acredito que não faça sentido um praticante de uma arte marcial criticar a outra arte, achando falhas ou defeitos, pois ele não comunga da mesma lógica e não faz parte da sua prática. Volto a repetir que dentro do praticante está presente a boa aplicação ou não da técnica e dos preceitos, mas não a arte marcial em si.
Observar um praticante aplicando com deficiências alguma técnica, deixando brechas, não significa que o movimento que deveria ser aplicado seria aquele.
Nem todas as técnicas treinadas pelo Aikido, por exemplo, têm por único fim a eficiência em um "ataque real". Existem outros conceitos que devem ser treinados, como "timing" (sen no sen, go no sen), respiração (kokyu), deslocamentos (tai sabaki), quedas (ukemis), utilização do quadril (koshi), manter a atenção no centro (hara), etc. Sem esse treinamento, nada no Aikido funcionaria, pois é uma arte muito sutil e que leva muito tempo para ser aplicada com proficiência (embora algumas técnicas possam ser aplicadas com muita eficácia num curto prazo de tempo).
Porém, acredito que o aspecto mais relevante de qualquer atividade praticada nos dias atuais seja melhorar a sociedade em que vivemos. Do que adianta alguém praticar a "arte mais letal" se existe a arma de fogo? 
Qual é o sentido de treinar durante anos técnicas que objetivam acabar ou lesar em definitivo alguma pessoa se qualquer um pode fazer isso com uma barra de ferro, sem qualquer treinamento?
Qual a sociedade que queremos?




É nesse ponto que acredito que o Aikido tem muito o que acrescentar e espero que todos aikidoístas tenham isso em mente, pois representam a arte que praticam e que possui uma grande função junto à construção de uma nova sociedade, menos violenta e mais solidária. Claro que isso por si só não evita desvios de conduta de algumas pessoas, mas a essência do treinamento deve ser essa.

Domo arigato gozaimashita

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